terça-feira, 18 de janeiro de 2011

A ENXURRADA VISTA DA TERRA
E (QUEM SABE?) DO CÉU



E nas sombras e desvãos da indulgência nacional, agem à sorrelfa, protagonistas e coadjuvantes sob as arcadas soturnas do poder. Como contar este cenário, ainda que eu falasse a transcendente “língua dos anjos”?...

Tem gente que pensa que o infortúnio da população serrana fluminense é algo que não lhe afeta, seja porque está geograficamente distante, seja por desconhecer as correias econômicas que interligam o país, seja por simples misantropia, por não se sentir solidário com o semelhante, por baixo nível de afeto e (cá pra nós) por ignorância mesmo.

Vamos a alguns fatos. A chamada “Região Serrana” afetada, mais o sudeste mineiro, de igual modo assolado, possuem vastas áreas de produção de hortaliças e frutas, que estão comprometidas por seis, sete ou oito meses devido à violenta erosão do solo, que foi varrido e lavado pela enxurrada e soterrado pela lama arenosa e pobre em nutrientes, que cobriu quase tudo. Tem mais. As cidades de Petrópolis, Nova Friburgo e Teresópolis são pólos de indústrias de laticínios, bebidas, confecções (lingerie) e ferragens. Atividades estas, que empregam um bom contingente de mão de obra e cujos produtos são consumidos por todo o país e pesam, em seus valores, na bolsa dos mais pobres, que gastam relativamente mais em alimentos e bebidas, além das ferragens de uso doméstico e da construção civil.

Assim, quando o morador de Recife ou Caruaru for comprar um cadeado ou fechadura também vai sentir no preço o reflexo das indústrias alagadas lá no Rio de Janeiro. Bem, este é o pior tipo de inflação. Aparece pouco nos índices. No IPCA, as hortaliças são apenas 0,5% para efeito de cálculo, por exemplo, mas, para os egressos da exclusão e demais pequenos consumidores vai haver conseqüências com percentuais bem mais elevados.

No entanto, somente daqui a quatro anos o país terá um sistema de prevenção de catástrofes eficiente. Informação governamental.

Não há aqui pretensão de comover os misantropos com argumentos sentimentais. Porém, é aconselhável que se observe a erosão do bolso que pode se seguir aos aguaceiros torrenciais deste mês. A taxa de juros tem viez de alta nos próximos dias, o que vai pesar até (e, sobretudo) para os desafortunados que perderam tudo e de algum modo vão usar de crédito para recompor seus pertences e estes não são poucos.

Alguns meios de comunicação, seja pela busca de audiência e leitores, ou pela limitação de suas editorias, focalizam os fatos em “big close” e se perdem no “zoom”, na tomada panorâmica das tragédias. Isto é um achado para quem está no poder ou à sua sombra. Quando se está no nono ano no governo, não há como se desculpar por não saber ou desconhecer. É aí, que funciona a catarse do relato, da exibição do drama desfocado de suas origens e conseqüências que virão sobre todos.

No crepúsculo morno de um janeiro brumoso voam silentes através das arcadas palacianas, aqueles que pairam sobre nós. Quem dera a “língua dos anjos”...


Casa Forte, 18/01/2011
Marcelo Cavalcanti
(81)93195627 - cavalcantimarcelo1948@hotmail.com

Nenhum comentário:

Postar um comentário